sábado, 17 de abril de 2010

Sobre executivos e álcool

por Adriano Silva

O diretor de atendimento de uma grande agência, que era inclusive sócio da empresa, a qual fazia parte de um desses grupos grandes ligados à publicidade, está fora do mercado há muitos anos, dizem, porque bebia muito. (E, dizem, é possível que continue bebendo.) Tive algum contato com ele há mais de dez anos, logo que voltei ao Brasil, e o sujeito sempre me parecera um bocado arrogante, com aquela empáfia de homem-branco-heterossexual-de-meia-idade-e-bem-de-vida, o que é um pouco a versão brasileira do Wasp americano. É curioso como atrás daquela pose toda havia uma fragilidade tremenda. Uma ferida funda, escavada na alma do sujeito.

O diretor comercial de uma grande empresa de comunicação também bebia muito. Instava os membros da sua equipe a beberem junto. Garrafas de ótimo uísque circulavam pelo escritório ao menos uma vez por mês, no finzinho da sexta. Dizem que o sujeito, que saiu do mercado bastante a contragosto (talvez a rotina de trabalho fosse a sua última tábua boiando acima do nível d’água – ou do álcool), está literalmente se afogando em sua aposentadoria forçada.


Álcool: tem muito pilar da nossa economia, muito pai de família com essa corda no pescoço.

E tem o executivo amigo meu que já encontrei várias vezes alterado, com olhos vítreos e fala empapuçada, exalando por todos os poros aquele odor de álcool curtido que só quem bebe muito tem. Há ali uma fome, ou melhor, uma sede de alma, de vida, ou talvez uma carência qualquer, uma insegurança, uma ansiedade, uma infelicidade, uma angústia, qualquer coisa, que lhe torna escravo dessa ingrata muleta. E aí o meu amigo, um sujeito divertidíssimo, perde o controle e se deixa viver abusado pela bebida, ao invés de usá-la controladamente para o seu prazer.

E tem o pai de um amigo meu, figurão da indústria da mídia nos anos 70 e 80, que não suportou a aposentadoria. Hoje começa a beber às 10h. E atravessa os dias bêbado. Talvez tenha se dado conta de que ele não era o seu crachá. De que a posição que ele ocupava não era dele, apenas estava com ele. De que as relações profissionais não eram pessoais. Ou talvez ele já bebesse há muito tempo e a aposentadoria apenas tenha trazido mais tempo livre para o exercício da sua ruína. O ócio pode ser uma atividade bem destrutiva às vezes.

Talvez o alcoolismo seja simplesmente uma doença. Talvez seja mesmo muito mais uma questão biológica e genética e química do que propriamente uma questão de comportamento, de escolha e de hábito. O fato é que tem muita gente respeitável, tem muito pilar da nossa sociedade e da nossa economia (esteja na ativa ou no estaleiro), enfim, tem muito pai de família que é escravo e que vive com essa corrente no pescoço – que às vezes parece mais uma corda prestes a esticar.

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