É só falar
Após alguns minutos de explanação sobre o problema da falta de ônibus no bairro, o líder comunitário Tavares franqueia a palavra:
– Quem tem alguma sugestão para solucionarmos a falta de ônibus?
O silêncio de alguns segundos fora quebrado por José Geraldo:
– Porque não vamos a prefeitura e pedimos para eles colocarem mais ônibus no bairro?
A vaia foi geral. Tavares aos berros proclamava que na prefeitura só tem patrão e que eles não querem saber do povo do bairro! José saiu dali ainda sem entender o porquê das vaias.
Pela manhã saíra de casa com a vontade de fazer parte da história daquela comunidade e de repente aquilo tudo acontece. Só quis ajudar, foi vaiado. Decidiu repensar a vida, esquecer-se daquela reunião e tentar pensar que sua idéia ainda é a solução para o problema da falta de ônibus. Não conseguiu. O som das vaias e sua fala e a de Tavares vinha na mente a cada passo. “Por quê?” Se perguntava. “Por quê o pessoal da Associação acha tão difícil simplesmente ir até a prefeitura pedir?”. “Isso é coisa do Tavares. Deve ser comunista!” Concluiu para si mesmo. “Se não fosse ele falar que na prefeitura só tem ‘patrão’ não teria vaia nenhuma. Ta vendo? ‘Patrão’! Isso é coisa de comunista!”
Sentou-se na soleira de casa para pensar antes de entrar. Tinha deixado mulher e filho para solucionar o problema do ônibus e agora teria que enfrentar a esposa, que já tinha alertado: “isso é coisa de comunista Zé! Teu pai te mataria se estivesse vivo!”. “Ignorante!” Pensou. “Se não tivesse fugido da escola!”. Entrou em casa, beijou o filho, abraçou a esposa e suspirou:
– Cê tinha razão Filó, isso é coisa de comunista.
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